
O Perfume, de Patrick Suskïnd, é um dos livro mais viscerais que tive oportunidade de ler. A sua envolvência consegue suscitar em nós os odores que retrata.
Jean-Baptiste Grenouille é a figura central da história. Uma homem nascido contra todas as adversidades, criado como escravo e tratado como lixo. Mas, não é isso que torna este personagem tão interessante. Jean-Baptiste tem um dom. Quase como um poder heróico, o seu olfacto é tão apurado que lhe permite distinguir todos os cheiros que o rodeia, a quilómetros de distância. Torna-se então obcecado por conservar todos os cheiros do mundo e criar ele próprio o perfume perfeito.
O cheiro do latão, do suor, do ferro, da pele. O cheiro da alma. Mulheres que mata, maioritariamente virgens, na busca incessante para conservar os seus odores. Torna-se num ser amoral, animalesco. Mas, acabamos por empatizar com ele. Seja pelo seu passado cruel, pelo seu objectivo sincero, ou pelo fim enternecedor. Ben Whishaw é também o culpado, graças à sua brilhante duplicidade. Assustadoramente doce. É tudo aquilo que eu imaginei em Jean-Baptiste Grenouille. Karoline Herfurth é lindíssima e o seu papel, ainda que curto, é quase perfeito.
Tom Tykwer, realizador do filme de culto Lola Rennt, cria uma obra, também ela, perto da perfeição. Todos sabemos como é complexo fazer uma adaptação de um livro para a tela. São sempre vítimas de críticas dos leitores que reclamam "aquela" cena que falta, ou "aquele" momento que não se passou bem assim no livro. Não obstante, o filme tem um bom ritmo e o realizador consegue absorver tudo o que é importante sem condensar demasiado a história. Tal como o sub-titulo indica, esta é a história de um assassino. Tudo o resto é contado partindo deste princípio. Nunca apressado, nunca aborrecido. Principalmente, o filme consegue ter o mesmo efeito que o livro. Desperta em nós todos os odores que recria, através do visual deslumbrante, da fotografia rica em cores vivas e texturas que quase podemos tocar.
Peca, por vezes, pelos maneirismos vanguardistas do realizador (a velocidade vertiginosa da câmara, que funcionou tão bem em Lola Rennt, aqui, parece desadequada) e pelos excessivos planos de pormenor do nariz do personagem. Por mais perto que filmem um nariz nós, espectadores, nunca vamos conseguir, realmente, cheirar nada. As imagens subtis e os sons da respiração parecem cumprir melhor esse objectivo. Mas, nada demasiado comprometedor, quanto a mim, para a genialidade global do filme.
Belo e perturbador, é a melhor forma para resumir este filme, que se arrisca a ser um dos melhores do ano.
 
 Etiquetas: Criticas |
O livro marcou-me tanto, quando o li há quase 10 anos, que nunca mais lhe peguei com receio de quebrar o encanto.
Confesso que a ideia de ver o filme não me atrai, mas acabarei por o fazer... eventualmente.
PS - vês, o pessoal vem cá ler e comentar. Até já estás nos favoritos há uns meses...